Pesquisadores do Museu de História Natural do Ceará (MHNCE) encontraram duas espécies de morcegos que nunca haviam sido registradas no Estado. Os mamíferos foram descobertos em Guaramiranga e Pacoti, na Serra de Baturité. Com esse achado inédito, a lista de espécies de morcegos no Ceará aumenta para 55.
Em entrevista ao Diário do Nordeste, a bióloga Nádia Cavalcante explica que as espécies encontradas são denominadas Myotis ruber, da família Vespertilionidae, e Molossus pretiosus, da família Molossidae. Ambos são morcegos insetívoros, ou seja, se alimentam de insetos.
Foram utilizadas redes de neblina para realizar a captura dos morcegos. Feitas de náilon ou poliéster, elas se camuflam no habitat e ajudam na apreensão dos animais.
“Nós colocamos essas redes em trilhas ou locais propícios por volta de quatro horas da tarde e ficava até meia-noite monitorando. A cada 15 minutos, nós fazíamos a vistoria, tirava os animais, colocava no saquinho de pano e depois ia fazer a triagem”, afirma.
As espécies encontradas costumam voar alto, o que dificulta a captura. Para Nádia, a descoberta foi uma ‘sorte’ e, provavelmente, os animais estavam saindo dos abrigos para se alimentarem.
O morcego-borboleta-avermelhado (Myotis ruber) foi capturado no Sítio Nova Olinda, em Guaramiranga. Nádia explica que ele tem uma coloração alaranjada, o que o diferencia do comum do Ceará que são morcegos cinzas ou pretos.
Os pesquisadores também descobriram que a Myotis ruber foi avaliada como Quase Ameaçada pela Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN). Essa classificação internacional considera que a espécie já enfrenta redução populacional e perda de habitat, correndo ‘risco significativo de desaparecer’.
O segundo morcego, da espécie Molossus pretiosus, foi avistado caído e morto no prédio do Museu, no campus experimental da Universidade Estadual do Ceará (Uece), em Pacoti. Ao contrário da Myotis ruber, possui baixo risco de extinção pela IUCN devido à capacidade de se adaptar às mudanças de habitats.
Ambas espécies costumam viver em ambientes úmidos e florestados, e estão geralmente ligadas a áreas com resquício da Mata Atlântica. A Serra de Baturité é um dos remanescentes de uma conexão passada entre o bioma de floresta tropical e o bioma Amazônia.

O estudo científico foi coordenado pelo pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e membro da direção da Plataforma Internacional para Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde (PICTIS), Dr. José Luiz Passos Cordeiro. A equipe ainda conta:
- Dra. Marcione Oliveira, bióloga especialista em morcegos do Museu Nacional;
- Dr. Aldo Caccavo, biólogo, pesquisador do Museu Nacional e, na época, curador da coleção de mamíferos do MHNCE;
- Dr. Giovanny Mazzarotto, médico veterinário da Fiocruz Ceará e do Instituto Carlos Chagas (ICC/Fiocruz);
- Dr. Hugo Fernandes Ferreira, professor da UECE e coordenador do laboratório de conversação de vertebrados terrestres.
CORONAVÍRUS E O PAPEL DO MORCEGO NO ECOSSISTEMA
A descoberta das novas espécies é resultado de uma longa série de pesquisas realizadas pela Fiocruz e estudiosos do Museu de História Natural do Ceará (MHNCE), iniciada em 2020. Na época, os pesquisadores investigavam a presença do vírus SARS-Cov-2, causador da Covid-19, em animais silvestres.
Os cientistas buscavam monitorar se o vírus que causou a pandemia também circula em animais como morcegos e roedores no Ceará. Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a contaminação desses mamíferos e a transmissão para os seres humanos é considerada a “possível ou provável” origem de contágio da pandemia de Covid.
Por sua vez, os morcegos frugívoros — que consomem frutos de plantas — dispersam sementes que ajudam na reprodução e regeneração de florestas e áreas degradadas. Já os nectarívoros carregam pólen de flor em flor enquanto se alimentam de néctar, contribuindo para a polinização das plantas.
Assim, caso a população encontre algum morcego em casa, a bióloga Nádia orienta que não se deve tocar ou retirá-lo sem proteção. “A gente sempre pede que deixe o bicho seguro de alguma forma, com uma caixa ou depósito em cima, e que a população entre em contato com pessoas especializadas que possam resgatar”, explica.
Em Fortaleza, a população pode acionar a Unidade de Vigilância de Zoonoses – UVZ pelo número (85) 98938-7677.