Veja o que mudou para os cearenses um ano após a inauguração da Transposição do Rio São Francisco


Há exatos 12 meses era inaugurado o trecho do Eixo Norte do Projeto de Integração da Transposição do Rio São Francisco (Pisf). A maior obra hídrica brasileira tem por proposta garantir, ao fim de todas as etapas, o abastecimento de 12 milhões de habitantes nos estados do Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. O trecho inaugurado há um ano beneficia diretamente o Ceará. Aqui, o projeto prevê o beneficiamento de 4,5 milhões de pessoas.

Mas, 365 dias após a inauguração, o que mudou na segurança hídrica do Estado? As propostas nesta primeira fase foram alcançadas? Para responder esta e outras questões, o Diário do Nordeste ouviu representantes da Secretaria dos Recursos Hídricos (SRH) e da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh), e também entrevistou moradores do entorno do maior açude cearense e principal beneficiário da obra: o gigante Castanhão.

O engenheiro civil, mestre em Recursos Hídricos e titular da SRH, Francisco José Coelho Teixeira, avalia positivamente este primeiro ano de Transposição. Em sua concepção, a proposta inicial foi alcançada e, para 2022, o projeto deve seguir semelhante ao que ocorrera neste ano, com possibilidade de aumento na vazão da água transposta do Velho Chico para o Castanhão, localizado na Bacia Hidrográfica do Baixo Jaguaribe.

“O que o Ministério da Integração se propôs a fazer após a inauguração, aconteceu. Então avalio que [o cronograma] foi  dentro do previsto”, pontua Teixeira. A inauguração do Eixo Norte aconteceu na cidade de Salgueiro (PE), e, no mesmo dia, as águas romperam os limites cearenses e começaram a encher o reservatório de Jati, na cidade de mesmo nome, no Sul do Estado.

Roberto Moreira, de 67 anos é pescador artesanal há quase três décadas. Atraído pela “grande quantidade de peixes”, saiu de Itaitinga para pescar nas águas do Castanhão há pouco mais de dez anos. No início, revela, “era uma atividade lucrativa, a gente fazia muito dinheiro”. Depois vieram os sucessivos anos de estiagem a atividade declinou vertiginosamente.

Com a inauguração da Transposição, Roberto e tantos outros pescadores sonharam reviver os “grandes tempos de pesca”. A expectativa era impulsionar a renda e, finalmente, cessar com os inúmeros anos de baixa renda. Não aconteceu.

“Até hoje a gente espera. É como se não tivesse chegado nada. A água sumiu e hoje está saindo mais que entrando. A tendência, para os próximos meses, é baixar ainda mais [o volume do açude]. Desse jeito não tem como aumentar a pesca”, lamenta.

Roberto conta que há uma década, “apurava entre 100 a 150 reais por dia”. Hoje, “com muito esforço”, consegue pescar 10 kg de peixe por dia. O quilo é vendido por R$ 4.

Legenda: Mesmo com o aporte da Transposição, pescadores afirmam não ser possível expandir a atividade devido ao ainda baixo nível do reservatório
Foto: Honório Barbosa

Para Teixeira, no entanto, a transposição não pode ser observada por esse prisma. Ele explica que o Pisf não tem, “e nunca terá”, a capacidade ou missão de “encher o Castanhão”. “O Açude tem 6 bilhões de metros cúbicos. É impossível encher um reservatório deste porte por meio de bombeamento. O Castanhão só vai voltar a ficar cheio quando tivermos sucessivas chuvas volumosas, como ocorreu em 2012”, detalha o titular da SRH.

Ao que o projeto se propõe, aconteceu, que era trazer água ao Castanhão e garantir o abastecimento de milhões de pessoas da Região Metropolitana de Fortaleza neste período seco [segundo semestre do ano, onde as chuvas no Estado são escassas].

FRANCISCO JOSÉ COELHO TEIXEIRA
Titular da SRH

Ainda segundo Francisco Teixeira, entre março e junho deste ano, o Castanhão recebeu 65 milhões de metros cúbicos de águas transpostas do São Francisco. “Representa 1% da capacidade total do reservatório. Se analisarmos o número friamente, podemos pensar ser pouco, mas não é. Esse aporte garante segurança hídrica até o próximo ano. A RMF e o Vale do Jaguaribe não terão problemas de abastecimento”, afirma o secretário.

Questionado se a vazão poderia ter sido maior, Teixeira reforça que não. “A outorga da ANA [Agência Nacional de Águas] só permite o bombeamento de 25 metros cúbicos [por segundo] nas duas bombas atualmente em operação.  Neste primeiro semestre, a vazão para o Castanhão foi de 12 m³/segundo, é um número bom. E, temos que lembrar, que a operação ainda é feita de forma provisória. O caminho oficial dessas águas será o Ramal do Apodi que está em fase de conclusão”, detalha.

O geógrafo e diretor de Operações da Cogerh, Roberto Bruno Rebouças, reforça a explicação de que a Transposição não tem por objetivo “encher o Castanhão” e ilustra que, “com a atual vazão transposta, o açude levaria 21 anos para ser enchido e isso se não tivéssemos nenhum uso da água ou perda por evaporação”.

Legenda: Moradores observam as água transposta do Velho Chico ao Castanhão, maior reservatório do Estado
Foto: Honório Barbosa

Em sua concepção, “mesmo que a obra ainda esteja longe de chegar ao horizonte total, o objetivo inicial de aumentar o abastecimento e garantia hídrica da Região Metropolitana [de Fortaleza] do Vale do Jaguaribe, foi alcançado”. A referência que ele faz ao “horizonte total”, diz respeito ao número de bombas em operação. Atualmente são duas, mas o projeto final prevê oito.

Questionado o que precisa ser feito para aumentar o número de estações de bombeamento, Rebouças preferiu não comentar e disse apenas que “por ser uma obra da União, o Estado não tem gerência sobre ela”. A  reportagem tentou contato com o Ministério da Integração, mas não obteve retorno.

Em 2021, mesmo com chuvas abaixo da média, a Transposição possibilitou que nós conseguíssemos levar água para RMF e reforçamos o Vale do Jaguaribe. Isso garante um segurança para milhões de cearenses.

BRUNO REBOUÇAS
Diretor da Cogerh

Em 2021, o Castanhão teve aporte de 255 milhões de metros cúbicos de água, dos quais 64,5 milhões vieram do Velho Chico. Para o próximo ano, Teixeira revela que a SRH tentará, junto ao Ministério da Integração Nacional, aumentar a transferência de 65 milhões de metros cúbicos para “90 ou 95 milhões”. Neste ano de 2021, não haverá mais transposição das águas.

O engenheiro civil explica que, “transferir as águas no segundo semestre, quando não há chuva, as perdas por evaporação seriam muito grandes, não compensaria a operação”. Outro motivo, ainda segundo o titular da SRH, é a manutenção das estações de bombeamento que tiveram início neste mês de junho.

 

 

 

 

 

Sistema Asa Branca de Comunicação

FONTE: Diario do Nordeste


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